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A última vez que vi meu pai
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Nesta obra, um narrador anônimo conta sua história, misturando memórias e poesia, que prende o leitor pela curiosidade e pela emoção despertada pelo universo onírico criado pelo autor e que ultrapassa o próprio conto dando-lhe uma dimensão épica. É nesse universo de mistério que vão se revelando as histórias do pai, da mãe, do avô, da tia (todos personagens sem nome, o que contribui para aumentar a poética e densidade em que se envolve a narrativa) intercaladas sem a ordem cronológica clássica mas dentro de uma lógica que, no final, descobrimos que só poderiam ser reveladas assim. Do pai, o narrador lembra-se apenas da última vez que o viu, todos os outros elementos lhe são contados, principalmente pela mãe, mas é ele quem cria toda a motivação interior da trama e serve de "costura" entre os personagens que vão, pouco a pouco, formando o labirinto onde se movimenta o narrador. A narrativa é tão poderosa que podemos sentir o cheiro da terra, o corpo do fazendeiro visto pelo cavalo, a luz - que se assemelha à luz de velas - que ilumina os cômodos da fazenda onde os personagens traçam o destino que, mais tarde, descobrimos ser o do narrador. A história é contada na primeira pessoa. Um homem anônimo relata sua vida, e por que está ali, a um ouvinte oculto, que só descobriremos quem é nas últimas e impactantes linhas. Durante suas falas tomamos conhecimento do universo de uma família feudal brasileira, que vai se revelando, pouco a pouco, através de sentimentos de honra e de vingança, que acompanham seus membros durante toda a vida. É no seio desse universo, ouvindo vozes que parecem cochichadas por fantasmas, que o narrador constrói sua personalidade e fixa seu propósito final. As influências do autor são confessas. Abúndio, tem o mesmo nome e deficiência física do tropeiro que conduz o personagem de Pedro Páramo em busca de sua Comala, numa bela homenagem a Juan Rulfo, o genial autor mexicano. "Cem anos de solidão" e "Grande Sertão: Veredas" também deixam vestígios nesta pequena história que se insere no que há de melhor na literatura universal. Mas esta é apenas a apresentação de um conto, um magnífico conto, e não uma análise precisa do que ele representará para a literatura brasileira. Deixemos que os leitores façam suas descobertas. Deixemos que sintam a emoção de presenciarem um desfecho digno da grande literatura ou de um grande filme, pois, mesmo sendo uma história feita em flash back, "A última vez que vi meu pai" é profundamente visual e cinematográfica.
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